Estava a subir as longas escadas de pedra que davam enfrente a gólgota, chamada assim, por ser a representação espiritual da colina, onde foi o calvário de Jesus.
Fixei meus pés na beirada do monte, e de lá, avistei um grande vale, coberto de imensas flores amarelas e brancas do lado direito, e flores azuis e rosas do lado esquerdo. Ao centro, um imenso lago de águas cristalinas que refletiam o céu e os pássaros da mais bela plumagem.
Olhei para o meu lado direito, e percebi uma imensa pedra que poderia me deixar mais alta e poder vislumbrar a paisagem como seu eu mesma, fosse um pássaro e acabasse de aterrissar, mas, ansiosa a viagem retornar, num vôo de brisas refrescantes e lindas cenas naturais. Parei de pensar e subi a pedra com uma força dos deuses, pois, lembrei das palavras do Divino Amigo: “Vós sois deuses”, e aí então, acreditei que seria capaz, e fui.
Quando olhei a paisagem novamente, tive a enorme sensação de fazer parte da constelação de flores, folhas, terra, águas e céus, e que tudo era “um” e eu era “um”. Foi quando como desperta de um transe, ouvi uma voz masculina:
—Tu és uma centelha. Herdeira do divino e legado do homem. Fazes parte do todo, porque és essência!
Olhei assustada para o lado e dei de encontro com um homem alto, de pele branca, cabelos escuros encaracolados e olhos azuis vibrantes. Ele carregava uma enorme espada, que a deixou fincada na terra.
Não consegui dizer uma única palavra, é como se elas sumissem de minha garganta, mas, não do coração. Pois, esse, pulsava forte num compasso de êxtase e temor. Mas, logo o temor não deixou resquícios, pois, a vibração de ternura e amizade tomou conta de meu íntimo, e a certeza da luz, me acolheu por completo.
Aquela figura altiva apontou-me a gólgota e percebi que ao lado dela havia uma imensa cruz, tendo como base uma forte rocha. Ela estava cravada. Mais uma vez o ser “um” se representou aos meus olhos. Ele sorriu, e disse:
— A fé é o estímulo verdadeiro do cristão, a base da cruz, a rocha que não desvanece por milhares de anos. E a cruz, o amor vivo e complacente da verdadeira luz guia, dos cegos na ignorância.
Nesse momento, retirou a espada fincada na terra e a mostrou apontando-a em direção ao céu e completou:
— A verdadeira batalha é fazer-nos luz, íntima e profunda, para que sejamos capaz de alçar um vôo linear as estrelas, como um pássaro guia que deixa suas penas luminosas pelo caminho, para que outros possam segui-lo.
Diante das palavras emitidas ao meu pensamento, meu corpo estremeceu, meus olhos fecharam, e uma brisa forte envolveu-me arrastando-me inerte aos braços daquela cruz, e ali fiquei, agarrada, protegendo-me confiante, do vento que se fazia cada vez mais forte. Inebriada, fui arrancada da cruz e abri meus olhos. Ofegante, reconheci meu lar, meu quarto, meus pertences. Sentei-me a beira da cama, impulsionei-me, ainda abatida, em direção a janela, abrindo-a rapidamente. Vi as estrelas ao longe, brilhantes. Suspirei, agradeci, chorei e adormeci.
Ana Rosa Zuffo